Gabinete do Levi

No Tecnics Mensagens : 61 Data de inscrição : 05/10/2014

Gabinete do Levi

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Eram cerca de 19:00 quando bati à porta do gabinete dele, com uma pasta enorme de relatórios nas mãos. Pus-me a olhar em volta enquanto esperava ordens para poder entrar............. A pensar em como tinha saudades do pai e a imaginar até que ponto ele deveria estar triste e com saudades minhas. Eu morria de saudades dele ali. Todos os dias lhe escrevia, passava horas em frente a uma mísera folha de papel todas as noites, chegando por vezes a enviar-lhe maços enormes de cartas de cada vez que nos era permitido estabelecer correspondência com as pessoas que tínhamos em nossas casas. Contava-lhe tudo... O que fazia, as coisas que dizia, por que passava... De manhã à noite, fazia-lhe relatórios infindáveis... Bem, quase tão infindáveis como aqueles que agora trazia em mãos para o Capitão...... O que, conhecendo-o da forma que conhecia e pelo que ouvia todos dizerem dele, não seria uma opção muito feliz. Eu gostava de detalhar bem as coisas, colocar todos os pormenores em cada frase... Talvez tivesse de aprender a escrever as coisas mais resumidas para não ouvir um grande sermão, da próxima vez. Se bem que....... Seria problema apenas dele, se não gostasse das coisas daquela forma. Era o meu trabalho, eu fazia-o como achasse melhor.
Suspirei de novo, continuando à espera que ele me desse a ordem de entrada, olhando a porta seguidamente.

No Tecnics Mensagens : 54 Data de inscrição : 05/10/2014

Revirava as páginas de relatórios infindáveis, de cada soldado, de cada subunidade, de cada equipa da merda daquele regimento... Porque é que a burocracia vinha sempre toda para mim? Ah pois, o Erwin tinha dito que era a forma mais rápida para eu me habituar ao lugar... Talvez o Erwin precisase de ajuda de umas quantas pessoas quando começasse a cagar cabedal, de tão fundo que eu lhe ia enfiar a bota boca a dentro da próxima vez que o visse. Soltei um grunhido de frustração quando ouvi a porta, três sinmples batidas que se prolongaram como um ecoar de "mais trabalho!" pela minha cabeça.
- Entre- Disse apenas, curto e grosso, não me dando ao trabalho de levantar os olhos do relatório que ainda tinha aberto nas mãos. Era melhor assim. Era melhor porque se eu visse a nova pilha de papéis que aí vinham ia haver merda.

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Suspirei antes de entrar, cerrando um dos punhos contra o molho de papéis, que carregava bem direitinhos e cuidados contra o peito. O próprio tom dele era totalmente frio, totalmente duro e desprovido de qualquer tipo de emoção. Normalmente, o Capitão era daquele tipo de homens que tentavam ser mais machões do que aquilo que eram, na verdade. O tipo de homem que conseguia ser exigente demais, perfeccionista demais. Com tudo. Não que isso não fosse objecto de admiração. Ele tinha ideais que tencionava conquistar, lutava com todas as suas forças pelo que verdadeiramente acreditava... Isso era digno de bajulação. Eu achava-o. Mas aquele tom.......... Não conseguia chegar para aligeirar o ambiente quando tínhamos de lidar com ele em primeira mão.
Fechei a porta atrás de mim, avançando até à sua secretária em passos calmos, leves e simultaneamente nervosos. Ponderei sobre a melhor forma de dizer-lhe o que fazia ali, apesar de saber que ele já esperava o meu trabalho há demasiado tempo, a julgar pelo molho de folhas que tinha espalhadas na secretária e que deveriam ser os relatórios de outros meus colegas da Squad. Os meus olhos caíram daquele molho que quase se igualava ao meu, ao que eu trazia em mãos. Não acreditava que aquelas folhas todas pertencessem apenas a um dos soldados dali... O que significava, muito provavelmente, que ele ficaria absolutamente irritado com a minha excessiva precisão. Respirei fundo.
- Vim... Trazer-lhe os meus relatórios sobre o último treino... - tentei começar por dizer, baixando a cabeça depois, completando finalmente a informação com um ténue... - ... Senhor.

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- Podes deixar no único espaço livre, que ves nesta pocilga. - Disse, sempre no mesmo tom, antes de abanar a cabeça e riscar várias frases de seguida no relatório. Não era suposto contarem a merda todos os passinhos que deram a cada merda treino caramba! Não preciso de saber se viram a puta de uma borbuleta a passar ou se determinado golpe vos fez doer os tomates! Apenas digam "treinei, melhorei, piorei, parti uma costela, cortaram-me parte de uma braço", para eu saber o que fazer!! Respirei pelo nariz, exesperado, levando depois a mão às palpebras. Com calma agora... Com muita a porra de muita calma. Calma o caralho!. Eu não os podia mandar todos para a lavoura e mandar vir a próxima resma, ou então arruma-los com jeitinho num dos troncos da floresta e espanca-los ate cuspirem os órgãos? Talvez não fosse ético da minha parte... Fodasse a ética.
Reparei nessa altura na pilha de relatórios que ela me trazia, parando cada movimento.
- Eu espero bem que isso não seja só o teu relatório... - Disse num tom de ameaça.

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Engoli em seco de novo, levantando o queixo depois. Ele... Podia meter respeito - que punha, nisso não havia dúvidas - mas na pior das hipóteses a única coisa que podia fazer seria dar-me um sermão enorme devido ao tamanho do meu trabalho. Não iria prender-me por isso, nem sequer dar-me uma sova. Logo, eu não tinha o que temer. Certo?
- Sim, é... - acrescentei novamente, no final... - ... Senhor.
Coloquei as folhas bem direitinhas sobre o único espaço livre da secretária dele. Olhei-o, seguidamente, sempre de queixo erguido, o mais dignamente que era capaz, enfrentando-o olhos nos olhos. Normalmente... Toda a gente temia quando os olhos dele recaíam sobre si. Eu não. Simplesmente, porque eu pensava que não havia do que ter medo. Era apenas um homem, como qualquer outro. Tinha somente mais autoridade do que os restantes no Squad.

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Olhei-a durante um longo período de tempo, juntando ambas as minhas mãos ao recostar-me para trás, apoiando depois o queixo sobre a união das mãos. Eu lembrava-me dela, no meio de tanto bezerro que me tinha sido dado para torturar desta vez. Era a pequena que, juntamente com a Ackerman, me tinha atacado no primeiro dia de Treino Corporal, após o idiota do Yeager ter dito que não sabia bater em mulheres e eu, prontamente, me ofereci para lhe dar o exemplo. No meio de várias histórias levantadas para conseguir irrita-las lá consegui que me atacassem, terminando com a escaramuça em menos de dois segundos. A partir daí, quer o Yeager quer a Ackerman me olhavam com os mesmos olhos que todos os outros. Esta não.
- Ral, certo? - perguntei somente.

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- Sim, Senhor - disse prontamente, pondo-me em sentido mal ele disse o meu nome. O meu queixo continuava tão levantado como no início, os meus olhos encarando-o com o mesmo respeito e firmeza de desde que eu lhe entrara gabinete a dentro.

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Suspirei, estendendo a mão para o meu tinteiro brincando com ele na mão ao mesmo tempo que me afundava mais na cadeira, sempre de olhos fixos nela. Estava tentado a perguntar-lhe quantas vezes ela achava que conseguia limpar as cavalariças antes de cair para o lado... Era tentador... De mais...
Derramei simplesmente todo o conteúdo do meu tinteiro sobre o relatório dela, olhando depois a mancha negra, fingindo-me de admirado.
- Ora bolas... Realmente eu só faço merda mesmo. - recostei-me para tras na cadeira de modo a conseguir apoiar os pés na secretária, empurrando depois o que restava do relatório direto para o meu caixote do lixo. - Suponho que me saibas fazer um breve resumo do que escreveste, certo?

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Fiquei a olhar boquiaberta para as folhas, cerrando os punhos zangada mas sem perder a postura. Ele... Ele tinha feito de propósito, aquele...! AHHHH eu ia matá-lo! Idiota, imbecil, estúpido... Eu tinha demorado horas a escrever aquilo, tinha feito o meu melhor, tinha explicado as minhas ideias o melhor que conseguia em cada linha...! Ele ficava mesmo assim tão satisfeito quando era mau daquela maneira para nós? Quando se fazia de durão implacável? Ele pensava o quê, que era o metrozinho e sessenta dele que me metia medo????!!
Levantei só mais o queixo, tentando manter-me tão digna como antes. Não ia descer ao nível daquele estupor cruel. Isso era o que ele queria, para me poder mandar para as lavouras. A mim não me mandava ele embora, eu não ia sair dali, não ia dar-lhe esse gostinho. Era um relatório oral que ele queria, certo? Pois bem, então... Era isso que eu ia dar-lhe.
Comecei por falar do nosso primeiro treino logo após o toque da alvorada. Tal como nas minhas folhas, fiz questão de dar algumas sugestões em coisas que não concordava ou que achava que poderiam melhorar e no quê, de modo a tirar o melhor proveito dos talentos de cada soldado da Tropa. Mencionei algumas técnicas de alguns dos veteranos que poderiam ser-nos ensinadas e sugeri até mesmo alguns nutrientes que sabia que, ao serem ingeridos pelo menos uma vez ao dia por cada homem, lhe dariam uma maior capacidade de resistência para aguentar os treinos durante um maior número de tempo. Não notei o tempo certo durante o qual falei. Mas disse tudo o que tinha a dizer, sem cortar o discurso ou vacilar nas palavras uma única vez.
- ... Para terminar, tal como referi no relatório escrito, penso que o Capitão poderia substituir o instrutor Keith nos treinos do "3D Maneuver Gear". Não tenho nada a dizer contra quem nos foi atribuído, apenas acho que, para treinar soldados mais fortes e melhores, é com o melhor que devemos aprender. Penso que seria muito mais proveitoso para a Tropa e para quem está a começar a recruta ter uma visão mais aprofundada da técnica, visto que ela é tão importante nas batalhas contra Eles... - disse finalmente, sempre na mesma postura direita, enfrentando-o olhos nos olhos sem desgrudar nem durante dois segundos - ... O resumo que lhe daria oralmente seria este, mas creio que teria sido interessante para si saber ao certo todas as sugestões completas que dei e que estavam mencionadas nessas folhas. Por nada em especial, não me considero superior a ninguém, acho apenas que coloquei nelas todos os aspectos que a maioria dos soldados quer ver aprofundadas e discutidas, mas nunca se recorda após os treinos ou tem receio de expô-las para análise dos superiores... Senhor.

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Prestei mais atenção do que aquela que queria demonstrar, à medida que ela ia prosseguindo com o relatório. Não me fez um resumo breve, como eu bem lhe havia pedido, mas só o facto de mo ter relatado sem me obrigar a ler já foi um descanço para a minha cabeça. Acenei no final, dando conta que apoiara os cotovelos sobre a secretária e o queixo sobre as mãos, de tal forma absorvido ficara pelas ideias dela. Fixei umas quantas, enquanto me voltava a recostar para trás.
- De facto o Keith parece mais a porra de uma múmia que outra coisa, dúvido que ele próprio ainda consiga se equilibrar no 3D sem bater com a merda da careca no chão, à semelhança do Yeager. - Suspirei, volteando a caneta na mão, como normalmente fazia com as facas e as adagas. O ritmo lento do voltear depressa ameaçou se estabelecer na minha cabeça, devido ao cansaço. Espetei a ponto no tinteiro seco e olhei para ela. Não custava admitir que ela era boa e sabia o que dizia.- Vou apresentar as tuas sugestões ao Erwin. De futuro, qualquer sugestão que tenhas é apresentada diretamente a mim, verbalmente. Não quero ver mais a ponta de merda de papel nenhum vindo das tuas mãos, estamos entendidos?

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Encarei-o apenas, quase me permitindo esboçar um sorriso ao ver até que ponto conseguira aguçar-lhe a curiosidade face ao meu ponto de vista em algumas coisas. Mas não o fiz. Permaneci tão séria como ele, apesar de me divertir o quanto ele se mostrara particularmente interessado no meu discurso. Tal como eu sempre havia pensado, tão armado em durão... Para quê? Com que finalidade, se no final ele era um homem como qualquer outro? Um soldado respeitado, temido é certo, mas... Apenas um homem.
Depois fixei-me no facto de que ele requisitara que os meus relatórios fossem todos feitos de forma verbal. Isso... Faria automaticamente com que eu tivesse de me preparar mentalmente para serões diários extra-treinos no gabinete dele. E digamos que o meu cérebro não aguentaria mais uma provocação como a daquele dia, eu tinha de reconhecer. Da próxima vez... Eu não me calaria tão facilmente. Eu sabia disso. Sabia que fervia em pouca água se a ocasião me obrigasse a tal. E sabia também o quanto isso me poderia prejudicar e à minha permanência na Tropa de Reconhecimento. Portanto, o meu cuidado teria de ser redobrado, de modo a não perder as estribeiras. Porque saberia optimamente bem fazê-lo pagar bem caro por desvalorizar todo o trabalho que eu tinha tido... Mas eu tinha a certeza que as consequências de eu fazê-lo me fariam desejar nunca ter ido tão longe.
Suspirei então, dando-me por vencida relativamente àquela batalha.
- Entendido, Senhor.
Eu reconhecia: tinha perdido a batalha. Mas ele que me aguardasse, porque ainda não tinha vencido a guerra.

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- Está dispensada então, cadete. - Disse, voltando a pegar no relatório que tivera em mãos antes de ela ter entrado. Só faltavam mais cinco e se riscasse tanto como riscara naquele... Olhei admirado depois para o meu tinteiro. Pois... Eu ia precisar de um novo. Levantei-me da cadeira, procurando nos armários atrás da minha secretária onde estava o stock de tinteiros... Juntamente com todo o material de limpeza para limpar a bela merda de serviço que eu fizera à minha secretária. Ouvi as botas dela juntarem-se para saudação, o rodar dos calcanhares e os passos até à porta. Quando a mão dela atingiu a maçaneta, falei uma última vez. - Ral? - olhei por cima do ombro, fazendo um ligeiro aceno com a cabeça. - Bom trabalho.

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Parei de repente com a mão sobre a maçaneta, bloqueando por completo ao ouvir a última palavra dele. Ele... Tinha mesmo... Tinha... Tinha-me elogiado...? Mas... Desde quando o impenetrável, duro e infalível Capitão Levi elogiava alguém? Desde quando ele seria capaz de tamanha façanha? Ele era mesmo...?
Olhei por um pouco para o chão ainda meio tomada pelo espanto, antes de virar os olhos na direcção dele, acenando simplesmente antes de engolir em seco.
- Agradeço, Senhor - Limitei-me a dizer antes de fechar a porta atrás de mim, saindo do gabinete dele.

Encerrado.

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Sempre aquele tom de surpresa...
Soltei um leve tsc ao virar-me de novo para dentro dos armários, pondo um pano de volta do nariz antes de fazer uma limpeza minuciosa à mesa, a cadeira e a tudo o que a rodeava. Tudo bem, tudo bem, não era normal eu elogiar cadetes, mas eu sabia reconhecer um trabalho quando ele era bem feito. Ou dava a aparência de nem isso ser capaz de fazer? Bem, eu sempre fora da opinião que as aparências se podiam ir foder umas às outras, em qualquer posição, e ter uma ninhada de filhos que nem assim eu queriria saber delas. Não era agora que iria mudar.
Voltei de novo aos relatórios, acabando tudo o que tinha a fazer (resumidamente, riscar mais de metade do que escreviam e no fim anexar uma nota para o excelentíssimo Comandante mandando-o apanhar no cu quando tivesse oportunidade para tal), antes de desligar a luz do meu gabinete e bater ruidosamente com a porta. Sentia os punhos a tremer... De raiva reprimida, enquanto eu fazia um esforço para me recordar dos nomes dos vermes que tinham escrito mais. No dia seguinte teriam um pequeno almoço reforçado a terra.

:: Encerrado ::

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